A árvore, um ipê rosa, está plantada ali desde mudinha e, como diz Seu Juca, foi uma criança muito acarinhada, por isso, hoje, é um belo exemplar adulto, que espalha graça pelo ambiente e, nos dias ensolarados, parece tingir as cortinas brancas com sua cor suave e iluminada.
Todos os dias pela manhã, na época da florada, sua beleza invade a varanda e convida o casal a abrir as janelas e os olhos para a beleza da vida. E assim os anos passaram, um cuidando do outro e de seu lugar no mundo. Seu Juca e Dona Tília moram ali desde que realizaram a mais doce cerimônia de casamento que se ouviu falar nas redondezas.
Mas tudo começou há muitos anos, quando o jovem casal chegou ao terreno, onde havia apenas um casebre, e começou a capinar. Como se diz... era só mato. O terreno deles era o único naquele pedaço. Então, arregaçaram as mangas e começaram a transformar o local no lar que imaginaram um dia. Como o jovem Juca já trabalhava como jardineiro ajudando seu mestre (um velhinho que o ensinou tudo e de quem herdou os clientes, o que facilitou a realização do sonho de comprar o terreno perto da serra e longe dos carros, da fumaça e das aglomerações), acabou recebendo dicas preciosas de como preparar a terra para plantar seu pomar, sua horta e seu doce jardim.
E mesmo quando tudo floria, preenchendo de cor, aromas e sabores o belo terreno, o casal, sentado na varanda do ainda casebre, admirando tudo que construíam, sentia falta de algo. Como precisavam de alguma coisa que não sabiam o que era, então, resolveram começar a construir a nova casa. Aos poucos, o casebre foi sendo demolido e as paredes da casinha sendo levantadas. Todo o dinheiro que os dois ganhavam, ele, primeiro como ajudante e depois como jardineiro; e ela, com seus trabalhos em tricô, vendidos aos clientes dele; era investido na propriedade.
Quando a casa ficou pronta, pintada de amarelo, com as janelas brancas instaladas, a varanda recebeu cadeiras de balanço e uma mesinha de vime. Na sala, no quarto, na cozinha, no banheiro, na área dos fundos, todos os cômodos eram enfeitados com peças de tricô feitas por Tília. Com o pomar e a horta em andamento, o jardim com as primeiras roseiras florindo, os dois admiravam a delicadeza da obra-prima que o empenho de ambos produziu.
Ainda assim, faltava uma alegria que eles não identificavam qual seria. E enquanto não descobriram, não quiseram marcar o casamento. E assim passaram dias angustiados, tentando descobrir do que tanto sentiam falta. E continuaram trabalhando, ele cuidando dos jardins dos clientes, ela tricotando suas peças de decoração, toalhas de mesa, tapetes, almofadas. Não ousavam morar na casa, por isso, armaram duas barracas na varanda, onde dormiam cada um no seu canto durante várias noites até que, numa tarde, o jovem Juca chegou muito animado, carregando uma sacola no colo, como se fosse algo muito precioso.
E realmente era uma preciosidade. A jovem Tília estranhou os cuidados extremos de Juca e só não ficou com ciúmes porque não era de seu feitio. Mas estava curiosa, largou as agulhas de tricô na cestinha e levantou apressada perguntando por que havia chegado mais cedo do trabalho. Dando um beijo em sua testa, Juca pediu calma, dizendo que tinha descoberto o que tanto faltava. Ela abriu aquele sorriso que o cativou desde a primeira vez que se viram e quis saber logo o que ele carregava com tanto carinho.
O jovem Juca abriu a sacola com cuidado e revelou uma muda com um galho comprido cheio de folhas verdinhas. Tília ficou encantada com a beleza da frágil planta. Juca ainda não sabia em qual ponto do terreno ia plantá-la, mas disse, sorrindo, que era um ipê rosa que ganhou de seu mestre jardineiro. E mais uma vez Tília abriu um enorme sorriso e abraçou Juca. Por alguns minutos, ficaram ali abraçados, observando a plantinha colocada na mesa ao lado da cestinha de tricô. Ah! Agora tudo estava perfeito para o casamento, poderiam preparar a cerimônia.
No dia seguinte, Juca acordou sobressaltado em sua barraca, sentou e só então percebeu Tília carregando uma bandeja com duas xícaras de café e dois pedaços de pão sovado. Nas cadeiras de balanço, os dois saborearam o café da manhã improvisado. De repente, Juca dá um suspiro e conta que sonhou com a localização exata do ipê rosa no terreno... seria no meio do quintal, perto da casa. Tília se anima.
Após o café, Juca pegou suas ferramentas e foi para o local exato, abriu a cova e plantou a mudinha. Três meses depois, com a plantinha firme no propósito de se tornar uma árvore frondosa, Juca e Tília se casaram. A cerimônia, realizada ao pôr do Sol, contou com Juca de terno branco de linho, que pagou em 12 vezes no crediário, e Tília com um belo vestido branco de tricô, produzido sempre nas horas em que ele estava trabalhando, e um véu de seda que ela havia ganhado, anos antes, de sua saudosa mãe, para irem juntas à missa. Os dois de mãos dadas, em frente ao jovem ipê rosa, deram as mãos, abençoados pela serra que tanto respeitam e protegem, rodeados pela casa, pomar, horta e jardim, rezaram a ave-maria e o pai-nosso, disseram palavras carinhosas um para o outro e trocaram alianças.
E até hoje, olhando para o ipê rosa, Seu Juca ainda se admira por ter sonhado com o local exato que em deveria plantá-lo. E dona Tília não esquece a alegria e emoção que tiveram ao testemunhar sua primeira florada. A sensação se repete ao longo dos anos, mas certamente aquele dia foi especial, tão especial quanto terem realizado o sonho de construírem seu recanto de amor.
*Texto escrito em homenagem à natureza e seus encantos. A ilustração é da Alika, minha querida sobrinha... afilhada... parceira... minha designer preferida... minha gêmea de boas... responsável pelas capas de meus livros... amor da madrinha (instagram@ilustralika)! Salve o ipê rosa, amarelo, roxo, branco e todas as árvores, flores e plantas que nos fazem tão bem! :)