sábado, 28 de setembro de 2024

O herói mascarado de Eisner

A obra de Will Eisner é realmente inspiradora, com belos roteiros e personagens bem construídos, é considerado um dos quadrinistas mais influentes da Nona Arte. Em junho, fiz uma publicação sobre algumas de suas obras, adoro! 

Agora quero falar sobre Spirit, o herói mascarado, criado em 1940. A coletânea, publicada pela JBraga Comunicação, em comemoração aos 80 anos do personagem, traz nove histórias, inclusive a que conta como o criminólogo Denny Colt se tornou Spirit, temido pelos bandidos de Central City. 

A que mais gostei é "Ouro", uma mistura de faroeste, mistério e aventura, mostrando toda a genialidade de Eisner ao criar ambientes, tramas e ilustrações, resultando em histórias que envolvem o leitor a cada quadrinho!

Achei interessante também os depoimentos, que precedem cada uma das nove HQs, assinados por profissionais renomados da indústria dos quadrinhos. Eles trazem detalhes da forma como Eisner trabalhava, sobre a criação de Spirit e reiteram a admiração que têm pelo artista que, além de ser considerado o pai das HQs, popularizou o termo graphic novel quando publicou, em 1978, o álbum "Contrato com Deus e outras histórias de cortiço"! 

Só faço uma ressalva, embora respeite muito o trabalho dos artistas que colorizaram cinco histórias, confesso que prefiro Spirit em p&b! Mas qualquer publicação com obras de Eisner vale a pena! Viva os clássicos das histórias em quadrinhos! :)

quarta-feira, 25 de setembro de 2024

De repente...

Um helicóptero passa zuncando por sobre a casa. Ela nem imagina quem poderia ser, então, continua fazendo o ponto de tricô mais complicado do Universo. Nada podia tirar sua atenção, mas aquele ruído, estava agitando seu pensamento. E, mais uma vez, ele passa, mas desta vez parece tão próximo que ela chega a pensar que vai aterrissar em seu quintal, já que o telhado está longe de ser um heliporto. Com a curiosidade aumentando aos poucos, mas ainda controlada, ela continua dando as laçadas, resmungando, apreensiva, para não perder o ponto.

O som se distancia e ela se concentra no tricô. Que ótimo! Só mais umas 10 laçadas e seu cachecol começa a se tornar realidade. Ainda está curto, mas bem adiantado. Ao todo devem faltar uns 30 centímetros pra concluir o trabalho, que, se der certo, será o primeiro de muitos que virão… e sua loja poderá, realmente, sair do papel, quer dizer, loja não, a portinha que herdou de sua avó confeiteira. Na época, a polêmica se instalou porque alguns familiares queriam que ela seguisse a culinária, mas não houve jeito, sua praia é mesmo o artesanato, especificamente o tricô! De repente, seus devaneios são interrompidos pelo som do helicóptero. Zangada, ela coloca as agulhas e o projeto de cachecol na cestinha de vime e vai até a janela. Uau! Como dizem, está um céu de brigadeiro! Azul anil, cintilante, sem qualquer nuvem, e o vento trazendo um aroma de baunilha. Ela respira fundo e quando olha para cima de novo, vê um cesto descendo do helicóptero, que se aproxima, lentamente, de seu quintal. As árvores envergam, a grama se achata e sua feição se torna cada vez mais aterrorizada! O que é isso, pergunta ela. Um ataque inimigo? Mas qual inimigo? Estou sempre na minha, nem tenho saído de casa, ando tão reclusa produzindo meus cachecóis!

Irritada, ela aperta os olhos para tentar ver quem se aproxima, mas não consegue… miopia é isso, à distância todos são um só… borrão! Ahahaha… que bom que ela ainda consegue rir de si mesma num momento de tensão como este. Com o medo falando mais alto, ela corre até a área de serviço e pega uma vassoura de piaçava, pelo menos, pode tentar dar umas pauladas, caso seja necessário se defender. O instinto de sobrevivência, quem sabe, a orientará na hora certa, afinal, ela nunca deu nem um catiripapo em ninguém, quanto mais pauladas.

De vassoura em punho, ela tem os olhos pregados no cesto do helicóptero, que paira sobre seu quintal. Quem será? Será que errou de endereço? Eu não estou esperando ninguém pelos ares, nem que um homem caia do céu pra mim… ahahaha. Rindo de nervoso, ela agarra o cabo da vassoura com força e dá um gemido, daqueles bem sentidos. Não acredito, isso é hora de uma farpa resolver espetar meu dedo? Se fosse só espetar, mas pela dor aguda, deve ter enfiado na pele, mas agora não posso pensar nisso, aguenta aí dedo, tenho que descobrir o que quer essa visita inoportuna. Neste momento, o helicóptero baixa mais um pouco, provocando uma enorme ventania, que faz com que seu lenço de cabeça se desamarre e saia voando pelo quintal, sorte que foi contido pelo galho de uma de suas árvores. Pelo menos, não se perdeu por aí. A cesta aterrissa, delicadamente, no gramado e ela fica impressionada com o que vê. O leitor deve estar pensando, um ET! Não, não parecia um extraterrestre, mas pela beleza poderia ser definido como “de outro mundo”. 

Com um sorriso enorme no rosto, ele sai do cesto com um envelope azul em uma das mãos e uma mochila na outra. Sem conseguir segurar a curiosidade, ela pergunta, com a voz trêmula: quem é você? Eu te conheço? Mais um sorriso iluminado se abre, marcando covinhas encantadoras no rosto dele. Você me conhece? Sou fruto de sua imaginação! Como assim? E o helicóptero? Também! Não estou entendendo, por acaso, essa farpa no dedo e meu lenço agarrado na árvore são minha imaginação? Não fique nervosa. Eu não estou nervosa, só quero entender o que está acontecendo! Será que minha vizinha de quase um século de vida me deu um bolinho batizado hoje pela manhã? Claro que não! Não tem nada claro pra mim, aliás, tá tudo nublado. Não estou entendendo… peraí… cadê o helicóptero? Ele abre os braços, encolhe os ombros e dá um sorriso sem graça. 

Ao fundo, a voz de sua mãe interrompe a conversa. O som da televisão está tão alto que parece que esse helicóptero tá sobrevoando nossa casa! Abaixa isso, menina! A mãe aparece na porta da sala segurando a forma do famoso bolo de maracujá e ela fica estarrecida, não pela sobremesa que exala um aroma delicioso pelo ambiente, mas pelo fato de tudo aquilo ter sido… Desculpa, mãe, não percebi que a TV estava com o som tão alto. Como consegue se concentrar no tricô desse jeito? Que cara é essa, menina? Nada... só minha imaginação fértil atacando de novo! :)

* O delicado e despretensioso desenho que ilustra esta crônica encomendei do meu irmão Gé (Gerson Donato)! Obrigada pela gentileza e parceria ❤️

sábado, 21 de setembro de 2024

As aventuras de Tintim na Lua


Estas são as duas primeiras histórias que leio da série "As Aventuras de Tintim". O tema definiu minha escolha... adoro a Lua e por isso resolvi que seria com esses volumes que iria mergulhar no mundo do personagem icônico, criado pelo belga Hergé. Publicadas no início dos anos 1950, muito anos antes da primeira expedição à Lua (1969), as HQs mereceram muita pesquisa do autor para que o enredo fosse bem construído e ao mesmo tempo divertisse o leitor. O bom-humor está presente ao longo das duas historias, inclusive, nos momentos mais tensos e arriscados. 

Hergé criou um estilo que se tornou referência e revolucionou os quadrinhos na Europa e influenciou artistas ao redor do mundo. Não é à toa que a Bélgica é a terra de grandes artistas da Nona Arte, onde os quadrinhos ganharam, em maio deste ano, o status de patrimônio imaterial de Bruxelas, capital belga, que abriga o Museu da História em Quadrinhos.

Em "Rumo à Lua", Tintim e o Capitão Haddock são convidados pelo professor Girassol a irem para Sildávia, onde está desenvolvendo um projeto ultrassecreto do governo: a construção de um foguete que levará tripulantes à Lua! Surpresos, Capitão Haddock, o repórter Tintim e seu cachorrinho Milu descobrem que serão, ao lado do próprio professor, os tais tripulantes, a partir daí a historia se desenrola. 
Gostei muito da dinâmica da narrativa, com informações técnicas reais e pitadas preciosas de bom-humor! Não vou contar mais detalhes, mas Hergé sabe como fisgar o leitor. Tanto que fiquei curiosa para ler o próximo volume!

Já em "Explorando a Lua", após enfrentarem várias tentativas de boicote à viagem, Tintim e companhia conseguem partir rumo ao satélite natural. Mas nem imaginam como a aventura, que por si só já seria tensa, terá lances de perigo e trapalhadas, inclusive a descoberta da presença de tripulantes inesperados e não menos atrapalhados. Além de ser uma leitura fluida e emocionante, o leitor se depara com informações técnicas impressionantes sobre uma expedição do homem à Lua, mesmo tantos anos antes de acontecer de fato. Em resumo, posso dizer que as aventuras de Tintim na Lua são diversão mais que garantida, com roteiro muito bem construído e cores encantadoras! Viva Hergé e sua arte! Viva as HQs que nos proporcionam viagens incríveis e inspiradoras! :)

quarta-feira, 18 de setembro de 2024

Um clássico das tirinhas brasileiras

Criador da revista Fradim, o cartunista, quadrinista, jornalista e escritor Henfil (Henrique de Souza Filho) revolucionou as tirinhas e soube driblar as dificuldades, fazendo o leitor rir, sem jamais deixar de alfinetar a política, a religião e as desigualdades sociais, durante os sombrios anos da ditadura militar. 


Com os personagens Fradim e Cumprido,  o cartunista ironizava a religião e seus tabus. Desbocado, cruel e provocador, Fradim está sempre debochando das culpas de Cumprido. Mas a tirinha abaixo, com a qual dou muitas risadas toda a vez que leio, mostra uma das poucas situações em que Cumprido leva a melhor... ahahaha! 



Já, no Alto da Caatinga, o trio de personagens formado pelo cangaceiro, Capitão Zeferino,  a simpática e representativa Graúna e o intelectual Bode Orelana, que come livros, jornais e revistas. O trio rende boas risadas, mas, acima de tudo, muitas reflexões, mostrando a desigualdade social que assolava o Brasil dos anos 1970, em plena ditadura militar; desigualdade essa que, infelizmente, continua severa até hoje. Na tirinha acima, Graúna deixa Zeferino e Orelana surpresos quando diz sentir que, finalmente, vai voar: "Quero que o vento histórico me erga do solo e me faça planar sobre a alegria dos Maracanãs, Morumbis, Mineirões...". Ah! Henfil não dava ponto sem nó... as entrelinhas eram sempre significativas! 
Viva a arte de Henfil! Viva a democracia que nos possibilita a livre expressão e a realização de sonhos! :)

* Dos números de Fradim que aparecem na primeira foto, comprei apenas o número 1, os demais ganhei de presente do meu irmão Gé, inclusive, o número 20, Fradim Mulher, adoro... ahahaha... ❤

sábado, 14 de setembro de 2024

Cowboy das HQs

Lucky Luke é um destemido e simpático cowboy, criado pelo belga Morris, com roteiro do francês Goscinny (sim, o mesmo roteirista do maravilhoso Asterix... adoro!). Ah... são as grandes parcerias franco-belgas, desde sempre, criando obras clássicas da Nona Arte e encantando leitores, de todas as idades, mundo afora! 
Esta coletânea, de 1959 - 1960, traz as histórias: "Subindo o Mississipi", "Na pista dos Dalton", "À sombra dos Derricks". Muito divertidas! Lucky Luke e seu cavalo, Jolly Jumper, são um charme e estão sempre prontos para enfrentar qualquer situação! A leitura é fluida, a narrativa de Goscinny é temperada por muita aventura e humor e a arte de Morris é dinâmica e envolvente!

"Subindo o Mississipi" conta a história de dois capitães que disputam o monopólio da circulação no Rio Mississipi e decidem organizar uma corrida com seus barcos. A disputa é acirrada, Lucky Luke ajuda o Capitão Barrows, em seu barco Daisy Belle, contra as investidas do Capitão Lowriver. Os personagens secundários são tão ricos que poderiam ter suas próprias histórias... rsrsrs... como o piloto do Daisy Belle e seu assistente sempre oferecendo um café! 

Em "Na pista dos Dalton", como sempre os irmãos Dalton fogem da prisão e Lucky Luke tem que recapturá-los! Mas o toque especial desta aventura é a ajuda que o cowboy recebe... a companhia de Ran-Tan-Plan, o cachorro mais atrapalhado do Oeste! Ahahaha... ele protagoniza momentos muito divertidos e mesmo sendo pouco ou nada eficiente, Lucky Luke aceita sua companhia. Já seu cavalo Jolly Jumper não acha a ideia interessante, o que também resulta em cenas divertidas!

"À sombra dos Derricks" gira em torno do petróleo, que até então não tinha valor de mercado até o dia em que se descobriu era um ótimo combustível. A partir daí, a pacata cidade de Titusville se vê sendo invadida por muitas pessoas atrás do chamado ouro negro, inclusive, Barry Blunt, um bandido que tenta se apossar dos poços de petróleo, quando entra em ação o astuto e corajoso Lucky Luke para por ordem na bagunça... rsrsrs...

Adoro o personagem e suas aventuras! É sempre bom ler e reler Lucky Luke, o problema é driblar a vontade de comprar os outros volumes da coleção! Viva as HQs clássicas que inspiram novos roteiristas e artistas! :)

quarta-feira, 11 de setembro de 2024

Pelas ruas da doce Paris

Pierre anda a passos lentos, ora olhando ao redor, ora pensando na vida. Sempre gostou de caminhadas solitárias. Quando criança, na hora da brincadeira, se não fosse dos primeiros escolhidos, o que acontecia com alguma frequência, logo tentava se afastar, na maioria das vezes com êxito, para caminhar pelas ruas. Gostava de ser pedestre, mesmo quando os amigos chamavam para um passeio de bicicleta, recusava dizendo que o primo a tinha levado, eram sócios na magrela. 

Claro que ele gostava de brincar e conversar com os amigos, mas tinha dia que preferia observar a vida e/ou refletir consigo mesmo. Ao longo dos anos, continuou gostando desses momentos de caminhada, que durante a faculdade e início da vida profissional ficaram mais espaçados. 

Aí vieram as atribulações da fase adulta e ele se tornou um entre milhões de robotizados, que sobrevivem de casa para o trabalho, do trabalho para casa, e, nos  finais de semana, comparecem às convenções familiares e sociais. Com tantas obrigações e responsabilidades, aos poucos, as libertadoras caminhadas solitárias foram rareando. 

Até que chega à velhice e sua vontade de caminhar volta com força, levando-o ao encontro daquele menino que adorava driblar qualquer situação pra assumir seu lado andarilho pelas ruas de Paris! Hoje, quando sai de casa, não precisa mais arrumar desculpas ou despistar ninguém, tampouco vai sozinho, leva sua bengala como companhia e dispõe de inúmeras lembranças que desencadeiam incontáveis reflexões! :)

* A foto que ilustra esta delicada crônica fiz quando visitei a cidade-luz (dezembro de 2015) e pude admirar a beleza de suas ruas e seus elegantes moradores, como esse senhor que tive a sorte de registrar! Merci, Pierre!

sábado, 7 de setembro de 2024

Momento Mafaldinha!

A Mafalda sempre me divertiu com sua inteligência e seu visual de menininha sapeca... rsrsrs... aqui mesmo já escrevi sobre ela (abril/2021), quando li o "Toda Mafalda", livro que reúne as tirinhas da pequena contestadora! Foi quando achei que tinha comprado a obra definitiva da menina criada por Quino. Mas aí, conversando com meu irmão Gé, descobri que havia outra obra chamada "Mafalda inédita", que reunia as tirinhas que não foram publicadas em nenhuma coletânea... e, na hora, fiquei com vontade de comprar. 

Passado um tempo dessa conversa, eis que me deparo com a notícia de que uma escultura igual a que tem em Buenos Aires (do artista argentino Pablo Irrgang) seria colocada na Livraria Martins Fontes, na Avenida Paulista... Ah! Sempre tive vontade de ir a Buenos Aires só pra sentar no banco ao lado da Mafaldinha... não fui, mas ela veio... ahahaha... e num sábado despretensioso, fui até a livraria e tive o prazer de me sentar ao lado de uma das mais importantes personagens das histórias em quadrinhos! Fiquei tão animada que, depois de registrar o momento em foto, entrei na livraria, decidida, e comprei as inéditas... rsrsrs... e como valeu a pena!

Além de contar os primórdios da personagem, o toque especial da obra são os textos narrando momentos marcantes da historia da Argentina e do mundo, ocorridos nos anos 1960/1970, contextualizando as tirinhas.
Viva a poderosa arte dos quadrinhos! :)

quarta-feira, 4 de setembro de 2024

Voar


Quando vejo o sobrevoo de pássaros em meio aos prédios fico imaginando como deve ser difícil pra eles avistarem uma árvore aqui e outra lá. Às vezes, voam sem ter um galho onde descansar e se abrigar do sol ou da chuva, muitas vezes, sobram-lhes os telhados das edificações que nem sempre são amigáveis. Mesmo assim continuam felizes pairando pela tarde ensolarada. São felizes porque voam naturalmente, asas abertas acompanhando o vento, ora planando, ora em voos rasantes. 
Triste das pessoas que não procuram ouvir o canto dos pássaros em suas rotinas estressantes. E pra quem diz nem se lembrar que eles existem, peço que se voltem às belezas naturais, estou sempre apurando os olhos para encontrá-los em suas revoadas ou pousados, como pinturas, nos galhos das benditas árvores que nos dão sombra e sossego. Adoro ouvir suas delicadas conversas cantadas, isso acalma, alegra a alma e nos humaniza. Experimentem! O mundo está precisando de paz e amor, porque “todos esses que aí estão atravancando meu caminho, eles passarão… Eu passarinho!”, já dizia o doce e grande poeta Mario Quintana. Viva a poesia, a sagrada Natureza e a sutileza dos pássaros! :)

*A foto que ilustra esta singela crônica é de minha sobrinha, que, sensível como a tia... rsrsrs, adora admirar e registrar pássaros de sua janela! Obrigada, Fe ❤ (Maria Fernanda, minha querida futura arquiteta)!