sexta-feira, 27 de outubro de 2023
Banana à milanesa
Dia frio
– A minha eu tenho certeza, mas a sua, realmente, sei lá!
– Que irritante sua mania de dizer sei lá pra tudo.
– Pra quase tudo!
– Tá bom. Voltando à tentativa de diálogo... sabe qual minha vontade nesse dia tão frio?
– Vou chutar...
– À vontade!
– Tomar um sorvete daqueles com calda de chocolate quente, castanhas grosseiramente picadas e espalhadas por toda a enorme taça, com suspiros partidos, um pouquinho de farofa... hummm...
– Caramba! Deu até calor de tanta coisa... você não tem vergonha de pensar que eu escolheria comer tudo isso de uma só vez? Principalmente, em se tratando de uma sobremesa? Açúcar, gorduras...
– Como você é estraga prazer. Só exagerei um pouquinho, talvez uma tradicional banana split fosse o suficiente!
– Uma inofensiva banana split... sei.
– Tudo certo. Vamos lá... então, qual sua maior vontade nesse dia frio?
– Depois de sua taça recheada de tanta infantilidade, acredito que minha vontade não vai ser interessante pra você.
– E desde quando sua vontade deve ser interessante pra mim?
– Como assim?
– Calma, não foi isso que eu quis dizer.
– Então, o que você quis dizer?
– Eu quis dizer que sua vontade deve ser respeitada, só isso. Coisa que você não faz, não respeitou nem minha sugestão de mergulhar em uma taça de guloseimas pra aplacar a preguiça que o dia frio está me provocando.
– Eu respeito sua vontade, só acho que um dia assim preguiçoso deve ser melhor aproveitado...
– Ah! Falou a criatura mais sensata do planeta.
– Agora, tô quase perdendo a vontade...
– Por favor, antes disso, diga: qual sua maior vontade nesse dia tão frio?
– De me aconchegar em você a tarde inteira.
– Emocionei, amor! Vem pra cá! :)
Fécula de batata
– O quê?
– O negócio é fazer o nhoque com fécula de batata!
– Eu entendi a frase, não entendi a razão de dizer isso agora, durante o café da manhã!
– Ah! Ouvi um cara gritando isso ontem...
– Gritando? Aonde?
– Nas esteiras rolantes. As pessoas, assim como eu, com pressa, indo comprar coisas necessárias, depois de um dia de trabalho, aí, de repente, surge um cara todo esquisito, gesticulando, e gritando detalhes da receita, dizendo que tinha de ser saudável!
– Era maluco?
– Sei lá... vai ver foi chef de cozinha e tava tentando passar sua sabedoria culinária para o mundo!
– Ahahaha... pegou a receita?
– Eu não, me concentrei pra não chamar a atenção do cara, até andei cabisbaixa, não quis olhar muito na direção dele, sei lá, podia cismar comigo, eu, hein!
– Ahahaha... se eu estivesse lá, ia perguntar por que é melhor com fécula de batata.
– Ah, tá bom! Até parece que você ia interagir com um descompensado.
– Que crueldade! Como você sabe que o cara é descompensado?
– Oras, pelo jeito dele! Fora do comum, os gestos muito amplos, não conversava com ninguém, gritava sozinho. E todos nós tentávamos manter a compostura pra que a situação não saísse completamente do limite.
– Nossa, que discurso! Será que esquisitice pega?
– Ahahaha... seu bobo!
– Mas como essa história acabou?
– Ah! Foi cada um para seu lado. Eu, por exemplo, entrei na loja que precisava, enquanto o cara desceu as esteiras rolantes, provavelmente, gritando sobre as vantagens da fécula de batata até que, talvez, algum segurança o convencesse, pelo menos, a falar mais baixo. Espero que não tenha sido maltratado.
– Que bom! Um pouco de sensibilidade e compaixão humana ainda habita seu ser!
– Por acaso, você está querendo dizer que sou insensível na maior parte do tempo?
– Longe de mim, amor, dizer que você é insensível na maior parte do tempo... não é mesmo, mas o problema é que na menor parte do tempo, a coisa costuma ficar tensa... ahahaha...
– Bobo.
– Cara de melão!
– Para com isso, tô ficando nervosa!
– Não vale a pena... te amo! :)
quarta-feira, 18 de outubro de 2023
De metrô a peixe assado
– Aquelas estações que têm conexão com outras linhas são as mais tensas. Outro dia, ia descer em uma dessas e, como sempre, fiquei perto da porta assim que o trem saiu da anterior.
– E daí?
– Peraí... tô contando uma história, a introdução é importantíssima!
– Tá bom! Continue sua narrativa.
– Não enche. Então, quando chegou na tal estação, percebi que ia ter bagunça antes do trem abrir as portas. Isso porque o trem da conexão para a outra linha estava ali paradinho do outro lado da plataforma. Pronto, as pessoas correm como se aquele fosse o último trem da conexão, o próximo só no Apocalipse.
– Que horror!
– Você não pega metrô, não sabe o que é isso.
– Nem vem, claro que sei o que é aperto e correria no metrô...
– Quando você pegava tinha bem menos gente.
– Ahahaha... do jeito que você fala parece que só peguei metrô na viagem inaugural, na década de 1970!
– Exagerado!
– Exagerado não, você que parece que esqueceu que a gente pegava metrô juntos pra ir pra faculdade.
– Pois é... sabe há quantos anos a gente se formou na faculdade?
– Hoje tá difícil conversar. É melhor eu ir na padaria buscar o peixe assado que encomendei.
– Peixe assado? Mas você nem gosta de peixe!
– Aí é que está, enquanto fica me chamando de ultrapassado, só penso em sua satisfação!
– Ah! Amor, eu adoro peixe assado... jura que você encomendou?
– Claro! Penso em você, gosto de te agradar, mas pela sua surpresa isso deve ser coisa de gente que vive no passado... vou ligar e cancelar o pedido.
– Não! Por favor, não cancela. Prometo que faço aquela farofa de ovo que você adora e que te ajuda a engolir o peixe que eu adoro.
– É isso... uma mão lava a outra.
– E as duas lavam a bunda!
– Desnecessária essa piada batida e escatológica!
– Olha quem fala, em vez de dizer uma frase mais romântica, vem com essa de uma mão lava a outra, completei com outra bobagem mesmo.
– Tá realmente difícil de conversar, você começou com metrô e fechou com bunda... lamentável.
– Deixa de ser enjoado. Quem cortou minha conversa sobre a bagunça no metrô foi você.
– E você queria o quê? Ficou tirando onda com a minha cara, perdi a vontade de conversar mesmo. Vou buscar o bendito peixe assado.
– Vai, amor, vou providenciar sua farofinha de ovo! Não fica bravo, meu sweet old man!
– Vai te catar!
– Ahahaha... romântico incorrigível! :)
Sacolas
Tem gente
– Tem gente que prefere viajar... outras preferem ficar em casa por meses seguidos, mergulhadas no seu mundo.
– Umas gostam de contar as aventuras que tiveram a cada viagem que fazem, outras preferem escrever um diário dos antigos, daqueles com chave e tudo, que ficam guardados no fundo de uma das gavetas da cômoda, do guarda-roupa, da mesa de cabeceira, da escrivaninha ou do baú da cama.
– Tem gente que gosta do frio, cachecol, pantufa e o aconchego do lar... outras preferem desfilar sua elegância de sobretudo e botas pelas paisagens congelantes.
– Tem gente que adora o calor pra ficar na praia, deitada na esteira, jogando bola, mergulhando ou caminhando na areia molhada e brincando de pega-pega com as ondinhas espumantes. Outras preferem a praia até na chuva, pra ficar jogando conversa fora deitado no sofá, olhando as gotas escorrendo pelo vidro da janela, jogando baralho ou, quem sabe, fazendo pizza.
– Tem gente que gosta de outono, andar pelas alamedas, pisando de leve no caminho coberto de folhas amareladas. Outras gostam de apreciar o iluminado e famoso céu da estação, fotografando cada paisagem inúmeras vezes até conseguir registrar a beleza dos dias mais fresquinhos.
– Tem gente que adora a primavera, as flores e suas cores e aromas, o canto dos pássaros e o cio urgente do planeta. Outras preferem a época pra fazer caminhadas logo cedo pra aproveitar os dias claros e ensolarados.
– Tem gente variada.
– Gente de todo o tipo, que gosta de cada coisa do seu jeito.
– E tem gente que gosta de tudo isso junto!
– Como a gente!
– Nós... sempre! :)
quarta-feira, 11 de outubro de 2023
Dia ensolarado
– Mas tá frio.
– Sempre tem um mas...
– Não tô reclamando, apenas alertando pra você não se animar muito com o céu azul e os raios de Sol entrando pela janela.
– Tarde demais, já me animei!
– Ahahaha... boa!
– Só o dia ensolarado já dá um ânimo a mais pra sair da cama, mesmo que com esse vento frio do caramba!
– Mas é isso que eu digo. O dia está ensolarado, mas o vento frio é pra dar aquela travada na gente, pra não rir muito escancarado!
– Até parece que o frio faz a gente rir menos. Eu digo isso sobre nós dois.
– É verdade, a gente gosta de uma gargalhada, inclusive, nos dias mais frios e em várias situações...
– Cite uma delas!
– Quando fomos à sorveteria em pleno inverno pra fazer uma foto e postar na internet, dizendo que chocolate quente é para os fracos...
– Ahahaha... mas refresque minha memória...
– Você já lembrou, só quer que eu diga com todas as letras que pedi três bolas na casquinha...
– Três bolas imensas...
– Pois é... três bolas imensas, sendo que a de morango resolveu se aquecer no meu decote...
– Que safadeza!
– E o pior, escorreu por dentro da roupa do peito ao púbis.
– Ahahaha... adoro ouvir você contar. E a foto tá lá nas redes sociais!
– Mas aquela foto foi antes da bola resolver fazer turismo em mim!
– Essa bola de sorvete sabe o que é bom na vida!
– Ahahaha... nós também!
– E como! Aproveitando o momento, quer tomar um sorvetinho comigo agora?
– É mais safado que a bola de sorvete, hein? :)
Sobre horas
– Desabafa...
– Obrigada pela delicadeza de querer me ouvir.
– Eu estou sempre aqui pra te ouvir, porque sei que a recíproca é verdadeira!
– Claro! Mas voltando às horas que parecem se arrastar, tava aqui lembrando de ontem, quando estava no trabalho esperando mensagens de e-mail que não chegavam e que impactavam minhas tarefas.
– E daí?
– Daí que as horas pareciam ter mais de sessenta minutos cada. Eu trabalhava pra caramba, mas como tem coisas que dependem dos outros, ficava alguns momentos pensando em como as horas, de vez em quando, teimam em não passar no ritmo que a gente gostaria.
– Como tá filosófica!
– Ah! Só quero entender por que quando a gente tá querendo socar um de tanta ansiedade, as horas parecem que se arrastam, parece que os ponteiros debocham da gente.
– Que ponteiros? Não posso te ajudar na elucidação desse enigma, só tem relógios digitais!
– Engraçadinho!
– É verdade! Mas lembro que minha avó tinha um relógio bem grande de ponteiros, que quando despertava, caía da mesa de cabeceira. Era um espalhafatoso, mas tenho saudade dele.
– Ótima lembrança da infância, mas o que eu quis dizer é que as horas parecem passar mais rápido em determinados momentos. E isso independe do relógio ser analógico ou digital.
– Adoro quando você explica tudo assim, séria! Mó orgulho!
– Ahahaha... bobo, me ajuda, por que isso acontece? Essa sensação aflitiva?
– Aflitiva... que palavra linda, amor!
– Também adoro a língua portuguesa, mas qual sua contribuição para elucidar esse enigma?
– Que maravilha dialogar com quem sabe construir belas frases!
– Obrigada pelo elogio, mas qual sua análise?
– Simples. As horas em que estamos trabalhando ou resolvendo problemas custam a passar, porque são recheadas de obrigações e responsabilidades e, às vezes, até precisamos que elas demorem um pouco mais pra não ficar nada pro dia seguinte. Já as horas em que passamos juntos correm como atletas olímpicos, precisamos colocar uns obstáculos pra que elas demorem um pouco mais a passar. E chega de conversa, vem cá, vamos aproveitar!
– Ah! Que amor! Esta é a análise mais fofa que eu já ouvi.
– Também te amo! :)