quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Entrevista com Lina Chamie! Oba!

Hoje, o Coisa Phina tem a honra de postar sua segunda entrevista! Desta vez com a cineasta Lina Chamie, diretora de "A Via Láctea", que, atualmente, se prepara para filmar "Os Amigos", que mais uma vez terá o ator Marco Ricca como protagonista e para um projeto, até o momento, chamado "São Silvestre", mostrando as sensações e emoções de um corredor durante a prova de rua mais importante de São Paulo e da América Latina, vale a pena esperar! Confira, a seguir, o que Lina pensa sobre o cinema, suas experiências como espectadora, alguns de seus diretores preferidos e "a dor e a delícia" de produzir cinema no Brasil! Obrigada pela grande entrevista, Lina! Beijos!

Coisa Phina - Qual sua relaçao com o cinema?
Lina Chamie - Cinema pra mim e muito principal, é fundamental. Minha relação com o mundo é o cinema, sob vários aspectos, porque na prática, eu trabalho com cinema e tem vários desdobramentos, várias atividades que estão relacionadas ao cinema. Mas o filme é a coisa que mais me atrai, o objeto filme! Achjo mágico, adoro! Uma vez me perguntaram se eu preferia ver um pôr do sol lindo ou um filme... de longe, eu prefiro ir ao cinema!

CP - Quais suas primeiras lembranças de uma sala de cinema?
LC - Tenho um marco na minha vida que é quando fui, aos 11 anos de idade, assistir "2001 - Uma Odisséia no Espaço" (Stanley Kubrick). Fui com minha mãe e me lembro que chorei de emoção, foi uma coisa surpreendente, porque eu nunca tinha chorado de emoção antes, só de chateação ou tristeza, mas de emoção, não! Aquilo abriu um horizonte pra mim, abriu um mundo, algo despertou ali, foi uma experiência inesquecível!

CP - Mas esta foi a primeira vez?
LC - Não, tenho outra experiência também inesquecível que é "Bambi" (Walt Disney). Eu era bem pequena e sempre digo que "Bambi" é o pior filme de terror de todos os tempos ou o melhor filme de terror de todos os tempos (risos). Eu me lembro da sequencia em que ele perde sua mãe, aquilo me marcou, fiquei desesperada. Eu diria que até hoje ainda não resolvi esta questão!(risos)

CP - Como você analisa o cinema brasileiro atual? Ele está no caminho certo?
LC - Eu penso que o cinema está legal, a gente tem filmes comerciais, a gente tem filmes autorais e temos, de fato, mais filmes produzidos. Estamos produzindo 80 filmes por ano, com conteúdos variados, estéticas distintas, temos cineastas de diferentes gerações produzindo filmes e uma nova geração muito boa.

CP - Um dos problemas do cinema nacional me parece ser o pouco tempo que ficam em cartaz.
LC - A questão da distribuição é muito difícil, os filmes ficam pouco em cartaz e, às vezes, nem entram em cartaz. A produção e a distribuição são muito difíceis no Brasil. Mas o cinema em si está sobrevivendo e está sendo feito e mesmo com todas as dificuldades, se fizermos um apanhado nos últimos anos, temos muitos filmes brasileiros e muito bons!

CP - No caso do cinema brasileiro, a falta de roteiristas é uma realidade?
LC - Não concordo, está todo mundo batendo o martelo pra falta de roteiristas, quando, na verdade, a gente nunca teve tanto roteirista. É engraçado porque também nunca se deu tanta atenção ao roteiro como atualmente. Claro que é muito difícil, mas temos editais de desenvolvimento de projetos, associações de roteiristas e temos a discussão em torno do roteiro um pouco mais presente. Temos ótimos roteiristas e temos muitos diretores que são roteiristas, mas claro que há carência, não somos uma indústria!

CP - As pessoas têm a mania de querer comparar o cinema nacional ao de Hollywood.
LC - Não há comparação. Agora uma coisa interessante é esse embate entre o cinema autoral e o cinema comercial acredito que também pode ter um viés saudável se a gente pensar que essas duas coisas podem coexistir, acho que um não anula o outro. O maior problema que a gente tem, volto a dizer, é a questão da distribuição e, talvez aí, um anule o outro, mas esteticamente não. Outra confusão que se faz é acusar o cinema autoral de ser não comercial pejorativamente, como se o autor não quisesse falar com ninguém, não é verdade! O objeto filme é um objeto de comunicação, a gente faz um filme para alguém, também é feito para um público, o que existe são públicos diferentes!

CP - O que achou de "Lula, o filho do Brasil" ser escolhido para tentar uma vaga para concorrer ao Oscar?
LC - A escolha do Oscar passa por questões de visibilidade e nesse caso, acredito que a escolha é não só pelo objeto filme, mas seu entorno e suas possibilidades mercadológicas. "Lula" é um filme sobre o presidente do Brasil e o presidente do Brasil está na moda, o cara é popular, está no mundo inteiro, então sob este viés a gente pode justificar a escolha, parece que logisticamente a esolha faz algum sentido.

CP - Falando em Oscar, quais seus diretores internacionais que você mais admira?
LC - Isso é sacanagem! (risos) Na minha vida Godard e Woody Allen são dois cineastas que quando forem embora eu vou ficar muito chateada, não gosto nem de pensar! Mas tem muitos outros, Scorcese, Bellochio, Fellini, Visconti. E tem uma coisa bonita que eu acho: como a gente pode ser grato a pessoas que a gente nem conheceu, então, esses cineastas e muitos outros... é uma gratidão pessoal, porque eles preenchem as nossas vidas, eles nos dão um norte, um sentido! Tem Elia Kazan, Hitchcok, a poesia dos filmes de Jacques Tati, não posso deixar de falar de Kubric!

CP - E diretores nacionais
LC - Tem filmes que gosto muito, como "São Paulo S/A" (Luís Sérgio Person), um filme que estruturalmente resiste ao tempo, tem uma estrutura supermoderna, é um filme com uma emoção muito particular com a qual me relaciono muito proximamente, a questão existencial, a solidão, o grande centro urbano e acho que isso está presente até no meu cinema, então, tem filmes que eu amo muito e, evidentemente, tem diretores também. "Limite" (Mário Peixoto) é inesquecível, um filme eterno. Glauber Rocha com "Terra em Transe" e "Deus e o Diabo", e "O Bandido da Luz Vermelha" e recentemente "Luz nas Trevas" (Helena Inês e Ícaro Martins) é maravilhoso, porque conversa com o "Bandido", e é lindo ter essa conversa no cinema brasileiro, como no americano, como Scorcese e Brian de Palma que têm filmografias que conversam entre si.

CP - Em seu filme "A Via Látea", você dirigiu Marco Ricca, como foi o trabalho com ele? Vocês já se conheciam?
LC - Não tinha feito nada, mas eu conhecia e admirava muito o trabalho do Marco, acho "O Invasor" (Beto Brant) um dos melhores filmes do cinema brasileiro, acho um filme muito belo e o Marco dá uma densidade ao filme que acho inesquecível. Sempre curti o trabalho do Marco e quando escrevi "A Via Láctea" de cara pensei nele, mas a gente só se conhecia de vista. Aí eu liguei para o celular dele e o convidei. E foi amor à primeira vista! Quer dizer, à primeira vista, não! (risos) A gente quebrou o pau no primeiro dia de filmagem, mas depois ficamos irmãos para todo o sempre. Mas é porque foi um filme muito vertiginoso, muito emocional e acho que essa discussão foi importante porque no segundo dia a gente se abriu um para o outro e aí encontramos um viés e foi uma coisa mágica. E esse filme nasceu muito dessa relação com o Marco, porque acho essa relação diretor ator muito importante, porque cinema é coletivo, todos fazem o filme!

CP - Você assistiu ao filme "Cabeça a Prêmio", dirigido por Marco Ricca? O que achou dele como diretor?
LC - Assisti e adoro! O filme é muito lindo, mas teve uma distribuição muito difícil, ficou pouco tempo em cartaz, merecia ter ficado mais! É um filme de atores e é muito bonito ver como, sendo ator, o Marco dirigiu esses atores. O filme parte do livro de Marçal Aquino e faz uma curva interessante, enfatizando o lado das relações, dos personagens!

CP - É um diretor de futuro?
LC - Com certeza, não sei se ele vai aguentar o tranco de dirigir, porque realmente é um tranco ser diretor de cinema no Brasil!

CP - Quais seus atores preferidos do cinema mundial?
LC - Daniel Day Lewis, tem muitos outros, mas de cara foi quem me veio à cabeça. E uma atriz incrível é a Naomi Watts, impressionante, mas tem muitos!

CP - E do cinema nacional?
LC - Nacional também tem muitos atores, o Marco (Ricca) com certeza! Tem outro ator que acho incrível que é o Caio Blat. Recentemente trabalhei com dos atores maravilhosos: Cássio Gabus Mendes e Júlio Andrade! Eu gosto muito de atores, eu, particularmente, acho emocionante trabalhar com atores, porque o ator é a alma do negócio, literalmente a alma do negócio e é emocionante porque o ator dá vida às coisas que a gente pensou e escreveu! O cinema é feito de momentos mágicos que se sucedem no tempo e que ao final vão terminar na tela e que até na tela continua vivo, porque você vê um filme de diferentes maneiras, em diferentes sessões o filme acontece e você muda com o tempo em relação ao filme e o filme lida com o tempo em várias dimensões e a gente está falando tudo isso por causa do ator, porque o momento de filmar é uma hora muito importante!

CP - Para a espectadora Lina Chamie, quais os clássicos mundiais que merecem ser vistos e revistos?
LC - Muitos! (risos) Tem que assistir "2001 -Uma Odisséia no Espaço" pela amplidão do assunto e pelo cinema de Kubric, tem que ver os filmes de Kubric. Tem que vedr Bergman, Godard, Woody Allen, Tati, Fellini, Visconti, Scorcese, Elian Kazan, David Lynch. Tem que ver "Irreversível" (Gaspar Noé). Tem que ver "Fale com Ela", de Almodóvar, pensar a humanidade do filme. Tem que esquecer a razão das coisas e ir pela intuição, tem que ver Buñuel, tem que ver Truffaud e a doçura do mundo, tem que ver 200 mil vezes "Os Incompreendidos" (Truffaud), tem que ver "Rocco e Seus Irmãos" (Visconti), tem que ver Mario Monicelli, são muitos filmes!

CP - Se você tivesse que ficar um mês em uma ilha deserta e pudese levar só três filmes, quais levaria?
LC - Se eu fosse agora, levaria "Fale com Ela", de Almodóvar, que apesar de toda a emoção é extremamente humano; "Hannah e Suas Irmãs", de Woody Allen para dar um alívio; e"Os Incompreendidos", de Truffaud para pensar um pouco!

CP - Existe algum filme que você gostaria de ter feito?
LC - Todos esses! (risos) Mas tenho uma história, eu gostaria de ter feito "Irreversível" (Gaspar Noé), porque acho de uma ousadia, de uma força e, ao mesmo tempo, de uma afirmação da vida! E quando esse filme estreou no cinema, estava muito ocupada e não pude ir, mas em uma noite de insônia eu liguei a TV e comecei a assisti-lo, já estava na metade, não tirei o olho da tela e quando acabou chorei muito de emoção, porque de fato ele tem uma coisa muito forte!

CP - O que te leva a dirigir um filme? O que interessa para a diretora Lina Chamie?
LC - Interessa dizer o que está vibrando dentro de mim e eu tenho que falar sobre aquilo, aliás não quero, tenho que dizer! Começa com um sentimento, que tem a ver com a vida da gente, porque acho que é a vida da gente que está nos filmes. Você fala sobre sua vida, sua experiência, seus sentimentos, o seu momento, por mais que tenha um roteiro, pra mim, é assim, não sei se para os outros diretores. Narrar é uma coisa do ser humano e o filme é uma maneira linda de narrar, uma maneira que permite sentimento em metáforas, o filme é um objeto sensorial também! Então, ele permite trabalhar questões que são muito importantes pra gente, enquanto a gente está vivo, enquanto a gente se sente vivo!

CP - Qual dica você daria para quem quer trabalhar com cinema?
LC - Ame o objeto filme, tem que gostar muito de fazer filmes e tem que gostar muito de ver filmes, o cinema tem que conversar com você, o que quando acontece já é uma situação maravilhosa na vida! Mas tem que gostar muito, porque não é uma atividade estruturada e de fato não é uma indústria. O fato é que fazer cinema é fazer filmes e fazer um filme é uma experiência maravilhosa, mas existe uma batalha por trás disso, lançar um filme é difícil! A dificuldade é enorme, mas tem que amar muito o negócio! Enfim, a resposta certa para esta pergunta é amor, tem que amar o cinema!

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