– Ah! Esse ano, realmente, cansei... presentear com todo carinho família e amigos e receber em retribuição aquela frase pavorosa: “não precisava”, quando na verdade, as pragas estão é disfarçando que não gostaram do presente... é de lascar!
– Você está exagerando...
– Eu? As reações são as mais terríveis, pior que isso só as dívidas que faço no cartão de crédito, gastando o 13º e deixando de comprar coisas pra mim pra agradar os outros!
– Ah! Mas o problema está no esforço pra agradar os outros!
– Ué? O que tem de mau em querer dar presentes pra quem a gente acha legal, quem a gente gosta, quem a gente respeita?
– Não tem nada demais até o momento em que você precisa da aprovação dessas pessoas.
– A única aprovação que preciso pra me endividar comprando essas tranqueirada é do banco!
– Isso tá parecendo trauma de infância. Pra que tanto presente e pra tanta gente?
– Agora, você vai regular a quantidade de presentes que compro?
– Longe de mim, até porque você tem dinheiro e crédito suficientes pra isso. Mas será que vale a pena ficar tentando agradar as pessoas e ficar nessa desolação?
– Não é desolação, é raiva mesmo! Cansei.
– Cansou? Então, diz pra mim... nessas sacolas que você tá carregando tem coisas pra você?
– A maioria...
– Não me enrola... dessas três sacolas, qual a porcentagem destinada à sua pessoa?
– Ahahaha... tive que rir... ah... sei lá... uns 30%.
– E você cansou de que então?
– Cansei das pessoas me olhando como se eu estivesse dando um remédio amargo. Ficam com aquelas caras de desgosto, feito criança tomando xarope.
– Que bom que você ainda consegue fazer piada...
– Mas estou começando a ficar sem vontade de levar na esportiva!
– Quem sabe assim você para de se endividar e de todo dia voltar pra casa carregando inúmeras sacolas.
– Inúmeras sacolas? Estou carregando três sacolas!
– Hoje, são só três sacolas. Normalmente, quase precisa contratar alguém pra carregar as comprinhas... e não me olha assim, você sabe que é verdade!
– Tá bom. Não vou discutir. A única coisa que quero agora é ir pra casa dormir.
– Ótimo! Então, nada de parar no caminho e cair na tentação de comprar.
– Já entendi. E mesmo que você não acredite... cansei!
– Amanhã você tenta me convencer...
No dia seguinte, na hora do almoço... a conversa continua.
– E aí? Vai me convencer que parou de comprar presentes pras pessoas queridas?
– Ahahaha... você é dose, hein?
– Ué? Você não disse que tinha cansado?
– Cansei!
– Tudo bem... tem alguma festa de família ou da turma por esses dias?
– Agora só daqui dois meses... mas resolvi que...
– ... ótimo! Você vai ficar esse tempo sem comprar presentes, certo?
– Quase...
– Então cansou do quê, pombas?
– Ahahaha... nada de presentes pra familiares e amigos...
– Não entendo ou nem quero entender...
– Vou presentear alguém que não conheço!
– Como assim?
– Qual sua dúvida, mente brilhante?
– Ahahaha... vou ignorar a ofensa. Mas me diz... vai continuar gastando dinheiro com presentes, mas
agora pra desconhecidos? E eu que tenho a mente brilhante?
– Qual o problema?
– Ah, sei lá! Não sou terapeuta...
– Está decidido... o que tinha naquelas três sacolas que você criticou ontem já tem destino certo!
– Acho que não quero saber, mas tem data definida?
– Ahahaha... não quer saber? Tá bom!
– Prefiro não me envolver nesse tipo de sandice...
– Sandice... não precisa usar palavras difíceis, você sabe que é brilhante... eu estava brincando.
– Vou trabalhar...
– Prometo que conto a você o resultado...
– Você acha que eu quero saber?
– Tenho certeza!
– Ahahaha... lendo minha mente, agora?
– Está escrito na sua testa. E fique feliz porque não vou te chamar pra ir comigo.
– Que os anjos cantem e toquem suas harpas em comemoração!
– Ahahaha...
Depois do almoço, voltam ao trabalho e ficam duas semanas sem falar no assunto.
– Hoje, foi cansativo, as reuniões se dividiram entre pouco úteis e completamente inúteis...
– Pois é, todas poderiam ser resolvidas com uma mensagem, um grito no corredor ou numa parada em frente à máquina do café.
– Concordo! Vamos tomar um sorvete pra relaxar? Tá um calor do caramba...
– Vamos...
– Você está com uma cara meio desanimada ou é minha impressão?
– Ah! Nem te conto...
– Pode contar...
– Você vai gargalhar na minha cara... não sei se quero passar por isso!
– Ahahaha... quero saber!
Na sorveteria, escolhem os sabores e uma das mesas na calçada.
– Espero você dar duas colheradas no sorvete. Isso, agora, já pode começar a contar... preciso saber
como foi sua experiência de presentear desconhecidos.
– Você tem tempo? A história é longa...
– Só trabalhamos amanhã... tenho o fim da tarde e a noite toda... só peço que me deixe dormir de madrugada, não gosto de acordar com olheiras...
– Pensei que não ia parar de falar. Mas de vez em quando, por favor, pode interromper a minha narrativa, assim consigo tomar o sorvete antes que derreta...
– Então, começa logo!
– Durante vários dias, eu fiquei pesquisando onde encontrar potenciais presenteados satisfeitos... e, na semana passada, decidi que ia começar por um orfanato.
– Legal...
– Não me interrompa.
– Ué? Mas não disse que era pra interromper?
– E por acaso já falei demais?
– Ah! Desculpe... não pode comentar?
– É melhor deixar os comentários, críticas e julgamentos pra depois que eu contar a história completa.
– Não sei se vou conseguir ficar de boca fechada.
– Controle sua curiosidade e preste atenção.
– Pode deixar... garçom, uma água com gás, por favor!
– Agora silêncio! Como disse, resolvi levar uma das sacolas a um orfanato, tinham bebês e crianças
até 10 anos. Escolhi as menorzinhas... nem imaginava como seria bizarro. Separei duas bonecas daquelas que parecem bebês, um caminhãozinho, um dominó e uma bola daquelas de praia. A bola, comprei no caminho para o orfanato... achei que precisava de mais opções. Quando cheguei, a freira que tomava conta deles me disse que como eu não tinha trazido brinquedos para todas as crianças...
– Desculpe interromper, mas quantas crianças tinha no orfanato?
– Ah! Sei lá... devia ter umas 30 ou mais...
– E como você fez pra não traumatizar a criançada?
– Então, como eu não tinha brinquedos para todas, a freira disse pra eu escolher as cinco crianças que ela as levaria ao pátio. A única sorte que tive é que fui no fim da tarde, quando a maioria está dormindo. Olhei em duas salas... e não tive muito o que pensar, a primeira que me olhava eu escolhia. Três meninas e dois meninos. Depois de alguns minutos, a freira trouxe os dois meninos. Pensei... ótimo... o caminhãozinho e a bola de praia. Os dois ficaram me olhando de longe, comecei a brincar como fazia com meus sobrinhos há séculos e um deles se aproximou. Uma graça... olhou os presentes... deu um sorriso e apontou pro caminhãozinho. Abracei o menino e dei o presente... ele se afastou... o outro se aproximou com os olhos brilhantes, mas quando viu a bola de praia, fez uma careta. E gritou... “NÃO! QUERO UM CAMINHÃO COMO O DELE”! Eu fiquei sem graça, pedi pra ele ter calma, expliquei que a bola era linda e que ele podia brincar com os amiguinhos... e a criança me olhou com ódio no coração e disse: “não tenho amigos... bola de praia pra quê? Não vou à praia, nunca fui à praia... quero um caminhão pra sumir pelo mundo”.
– Peraí... quantos anos tinha essa criança?
– Seis no máximo!
– E querendo sumir no mundo?
– A bizarrice não terminou aí. Eu tentei acalmá-lo, mas o moleque jogou a bola na minha cara com uma força impressionante que cai de costas. Tenho certeza que ouvi uma risada vinda do outro
moleque, o que ficou com o caminhãozinho. Levantei e disse a ele que não precisava ficar com o presente. Coloquei a bola de volta na sacola e cheguei perto do outro menino. Perguntei: e aí? Gostou do caminhãozinho? E a resposta foi em alto e bom som: “NÃO! QUE CAMINHÃO MAIS VAGABUNDO, JÁ PERDEU UMA DAS RODAS... ONDE VOCÊ COMPROU”? Sem saber pra que lado ir, peguei a rodinha do chão e o menino jogou o caminhão na sacola. Fiquei sem reação. A freira voltou, mandou os meninos pra dentro e disse que, em alguns minutos, traria as três meninas. Antes dela sair, contei o que tinha acontecido e sua resposta foi seca: “crianças são sinceras”!
– Preciso interromper... sinceridade é uma coisa, estupidez é outra... prefiro nem ver quando esses caras crescerem?
– Sei lá... eu sei que foi uma gritaria sem precedentes.
– E as meninas?
– Deixa eu tomar um pouco do sorvete. Garçom, mais uma água com gás!
– Espero que as meninas tenham sido mais amáveis...
– É melhor contar tomando sorvete. Então, a freira voltou em poucos minutos com as três... pareciam
três coisinhas delicadas. Por um momento, fiquei feliz, mas quando peguei a sacola com as bonecas e o dominó já senti que devia ter trazido três iguais. A primeira se aproximou, eu tirei uma das bonecas da sacola e, no ato, a menininha revirou os olhos.
– Não acredito!
– Pois creia! E ainda foi enfática: “eu não sei de onde você tirou que as meninas de seis anos querem
ser mães... eu sou uma criança... não sei cuidar nem de mim, nem tenho mãe... vou querer o que com esse bebê”? Nesse instante, a segunda menininha se aproximou e pegou o outro bebê nos braços... quando pensei que tinha acertado, ela cuspiu na cara da boneca e gritou: “GOSTO DE BRINCAR COM OUTRAS COISAS! HAJA IMAGINAÇÃO PRA INVENTAR HISTÓRIAS COM UM BEBÊ. ELES SÓ CHORAM, FAZEM XIXI E COCÔ... NEM SABEM CONVERSAR”! Quando pensei em pegar as sacolas e abandonar aquelas praguinhas naquele pátio, a terceira menina olhou dentro da sacola e pegou a caixa do dominó...
– E gostou?
– Só não gritou, mas disse na minha cara: “o que é isso? Se é um jogo, nem tente me ensinar... prefiro games. Uma das freiras sempre deixa a gente brincar duas horas por dia. E não olhe com essa cara alegre, ela não é muito boazinha, só faz isso pra gente parar de gritar. Arriscamos e deu certo, agora, gritamos todos os dias antes do jantar”. Depois disso, as três crianças me deixaram ali atônito, com cara de cão sem dono.
– Espera aí! Você voltou pra casa com os brinquedos?
– Deixei numa igreja no caminho de casa, nem esperei a reação do padre, deixei numa caixa de doação.
– Nem sei o que dizer...
– Calma... tem mais!
– Mais? Você não vai me dizer que ainda tinha mais presentes!
– Das três sacolas daquele dia, só uma era com coisas pra mim... as outras duas...
– Isso quer dizer, que tentou com a outra sacola?
– Claro... não basta ser trouxa formado, tem que fazer mestrado e doutorado!
– Ahahaha... conta logo!
– Como na sacola tinham camisetas, bermudas e dois pares de tênis...
– Dois pares de tênis? Por que não me deu?
– Ahahaha... em primeiro lugar, porque não eram pra você... lembra que eu resolvi não presentear conhecidos?
– Pensei que aquelas sacolas fossem pra sua família...
– Mesmo assim, nem pensei em você... sei lá se não ia me humilhar ou jogar o raio do par de tênis na minha cara.
– Ahahaha... você tem bom gosto pra tênis, tenho certeza que ia gostar.
– Não acredito em mais nada... nem sei se algum dia tive bom gosto pra roupa... mas desta vez escolhi um asilo.
– Ah! Escolheu bem! Os velhinhos costumam amar visitas...
– Cheguei na recepção e disse que queria presentear. A recepcionista com cara de poucos amigos perguntou se eu queria deixar a sacola como doação ou ia visitar algum velhinho em particular. Eu respirei fundo e pensei: já estou aqui mesmo, vou conhecer os idosos. A mulher me mostrou a sala de televisão, onde a maioria cochilava ou fazia crochê. E o terraço, onde três velhinhos jogavam baralho.
– Devia ter deixado o dominó pra levar no asilo... ahahaha...
– Vai rindo... Sentei na mureta perto da mesa onde os três jogavam e fiquei observando, senhores calmos e bem-humorados. De repente, um deles me viu e fez uma careta, perguntando: “vai nos dar algum remédio ou aplicar injeção”? Eu sorri e contei que estava visitando o lugar. Outro velhinho olhou bem pra minha cara e disse: “das duas uma... ou você tem parente aqui ou não tem o que fazer na vida”. Eu fiquei sem graça e antes que eu pudesse responder, o terceiro velhinho olhou pra sacola e soltou essa: “deve ser roupa velha pra combinar com a gente”. Eu logo disse que eram peças novas, presentes que eu queria oferecer a eles, tentei explicar com a maior boa vontade. Mas o primeiro velhinho tossiu, quase perdeu os sentidos... e, claro, só eu me desesperei, os outros dois me olharam feio, como se minha preocupação fosse uma ofensa. Resumindo, depois da crise de tosse, ele estendeu a mão e perguntou: “se é presente, mostre logo”! Eu abri a sacola com a animação querendo aumentar, tirei duas camisetas polo, duas bermudas, uma calça, uma camisa de manga curta, meias esportivas e dois tênis”.
– Presentão, hein?
– Realmente, eu devia ter te dado essa sacola...
– Ahahaha... por quê? Os caras não gostaram de alguma coisa?
– A pergunta correta seria: eles gostaram de alguma coisa?
– Eu não acredito.
– O da tosse olhou as camisetas polo e disse que jamais usaria uma daquelas: “coisa de burguês”! Eu mostrei a camisa de manga curta e o outro retrucou: “não percebeu que usamos camiseta simples... camisa é coisa de engomadinho”. Peguei as meias esportivas e os tênis, dizendo que eu tinha o presente certo. Putaquepariu, se eles não tivessem dificuldades de andar e dores nas juntas todas, acho que tinham me linchado.
– Por quê?
– Porque, incrivelmente, os três falaram, sem intervalo pra eu tentar responder “tênis pra quê? Andamos de chinelos”. “Pois é, temos problemas nos pés, unhas encravadas, joanetes e calos”. “Meias só no inverno mesmo... não temos costume de calçar nada, além de nossos chinelos arrebentados”. Fiquei sem voz e, por alguns minutos, não consegui articular uma única palavra.
– Que merda! Também saiu do asilo com a sacola?
– Não. Fui à recepção e deixei para doação geral. A recepcionista deu uma risada sarcástica e disse; “da próxima vez, pergunte antes o que eles precisam ou faça uma doação para a entidade. Bem mais simples e menos constrangedor, você não acha”? E minha voz que tinha voltado, resolveu sumir de novo. Sai de lá e fui direto pra casa.
– Tá... qual a moral da história?
– Parece que eu te narrei um conto de fadas... Moral da história?
– Eu usei ironia! Dá pra você me dizer a que conclusão chegou depois disso tudo?
– Eu sei lá! Tem que chegar a alguma conclusão?
– Ahahaha... tá bom... você tá em choque. Vou dizer... a minha conclusão é que você não nasceu pra presentear conhecidos nem desconhecidos!
– Crueldade! Quer fazer uma festa pra anunciar minha incompetência pra dar presentes? Aproveita e convida minha família, amigos de infância e do trabalho... vai ser ótimo!
– Para de drama... o que você pensa em fazer a esse respeito?
– Eu não terminei de contar...
– Mas não eram só duas sacolas de presentes? Não enrola, você andou comprando mais?
– Não... já disse que não! Essas duas sacolas eram para parentes e amigos, mas desisti porque não aguento mais as caras de entojo na hora que abrem... por isso, resolvi ofertar aos desconhecidos!
– Ofertar aos desconhecidos é o máximo! Ahahaha... quem ouve vai pensar sacanagem...
– Você que vê sacanagem em tudo!
– E você tem que parar de levar tudo a sério! Já pensou em conhecer outros planetas? Ahahaha... quem sabe você acerta nos presentes?
– Nem me fale...
– Não vai me dizer que tá pensando em viagens interplanetárias... ahahaha... se estiver, que a força esteja com você!
– Ahahaha... gostei! Mas o que tenho pra contar não é nada animador. Não bastasse toda uma vida dando presentes pra familiares e amigos e recebendo em troca fingimento e hipocrisia, e agora essas experiências catastróficas no orfanato e no asilo, tive um sonho...
– Adoro sonhos reveladores...
– Sonhei que ganhei o sorteio de um shopping: uma viagem para Marte com tudo pago... uma semana no planeta vermelho, tudo de graça! Arrumei as malas e, claro, levei várias sacolas. Assim que cheguei quis conhecer os nativos. Nem precisa me olhar com essa cara de espanto! Levei vários presentes para os marcianos.
– Você não tem jeito, mesmo!
– Espera... tinha toda a uma programação com passeios pelos pontos turísticos de Marte.
– Ah! Conta um pouco sobre esses pontos turísticos.
– Eu sei lá... é um sonho... só sei que tinham esses passeios, mas não com detalhes. Enfim, a programação incluía um coquetel num casarão, castelo... uma construção enorme... cheia de marcianos. De humanos, só a caravana do shopping... seis pessoas.
– Nossa! Você sempre VIP... até em Marte!
– Ahahaha... era uma recepção para os sorteados de diversos planetas, aliás, falando em Star Wars, parecia aqueles bares que o Han Solo e o Chewbacca gostam de aparecer, com tipos variados. Não me olhe com tanta curiosidade, não lembro de muita coisa.
– Conta logo!
– Calma... vou contar. No tal casarão, descobri uma sala onde vários marcianos ficavam isolados dos convidados... acho que não são apenas os humanos que convidam um monte de gente pra casa e perdem a paciência durante uma festa. Entrei com as sacolas nas mãos. Um deles me olhou, parecia...
– O ET de Varginha?
– Ahahaha... não! Aquele que a Nasa tem guardado naquela cidade americana, esqueci o nome...
– Eu sei... não importa o nome da cidade americana...
– Mas não era você que estava querendo saber dos detalhes agora há pouco?
– Chega de detalhes...
– Como quiser... comecei a tirar os presentes das sacolas e um dos marcianos chegou perto...
– Como eles se comunicavam com você?
– Era sonho... falando português mesmo...
– Ahahaha... até esqueci que você estava me contando um sonho.
– Pois é. Tirei dois pares de tênis da sacola, eram iguais os que levei ao asilo...
– Ah! E você nem pensou que eles podiam ter joanetes ou unha encravada?
– Ahahaha... Não cheguei a esse nível de intimidade... mas sei que os presentes que eu tirava das sacolas eram os mesmos que familiares, amigos e desconhecidos rejeitaram...
– Ah! Mas familiares e amigos não rejeitaram seus presentes, aceitaram com cara de contrariados, mas levaram...
– Tudo bem, mas pra mim funciona assim... de um jeito ou outro, todos rejeitaram meus presentes.
– Tá bom, mas e os marcianos?
– Quando comecei a tirar os presentes das sacolas, vários marcianos se aproximaram de mim, um deles até pegou um tênis na mão... antes que você me pergunte, a mão dele tinha três dedos enormes, tipo de sapo...
– E por que esse detalhe você lembra?
– Eu sei lá... é um sonho! O que importa é que quando estava com o tênis na mão, olhou pra mim com um sorriso enigmático e quando a confiança começou a se fazer presente em meu ser, perguntei se ele tinha gostado do presente e adivinha?
– O quê?
– Não deu tempo de ver a reação do mão de sapo... acordei!
– Ah! E cadê o sonho revelador?
– Quem disse que era um sonho revelador foi você. Mas já que insiste, tá na cara, inclusive no sorriso do marciano, eu acertei o presente! Ele deve ser atleta, ele adorou o par de tênis, deve ter ficado animado pra usar na próxima trilha, corrida, jogo... sei lá qual esporte pratica!
– E?
– Eu definitivamente nasci para presentear seres de outros planetas! Se na Terra só consigo caras de desagrado e humilhação, em Marte sei que ganharei um sorriso do presenteado.
– Mas vem cá... como você mesmo disse, era um sorriso enigmático... será que não era ironia?
– A inveja é uma merda! Agora, você vai querer saber mais do que eu que estive lá e senti a atmosfera amigável?
– Ahahaha... pensei que estávamos falando de um sonho!
– Como você mesmo disse, um sonho revelador! Tomei uma decisão! Nas próximas férias, vou visitar a Nasa e saber a quantas andam as viagens tripuladas para Marte. É a minha chance! Vou presentear alguém que não conheço...
– ... em outro planeta? Isso sim é desconhecido pra ninguém botar defeito.
Em meio às risadas, o garçom traz a conta, a sorveteria está fechando. Amanhã é dia de trabalho, agora é hora de descansar... ou será de sonhar?
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